RECEITA PORTUGUESA DE QUEIJINHO DO CÉU
Já provou queijinho do céu, um docinho português muito lindo e delicioso feito com massa de amêndoa e ovos moles?
Com certeza, quem gosta de amêndoa, doces d’ovos e portugueses tem que provar esse doce que não leva nada de queijo no preparo, tem esse nome por conta do formato que lembra um queijinho. Como diz a minha mãe, é uma preciosidade.
Há muitos anos, acho que no finalzinho dos 1990, fui com o Carlos a um congresso em Lisboa e a gente aproveitou pra passear de carro pelo interior por uns 10 dias.
Foi uma viagem deliciosa, cheia de vilas e aldeias lindas e muita coisa boa, com queijos, embutidos, curados e defumados, sopas, porco e bacalhau, azeitonas e doces, doces e mais doces com ovos e amêndoas.
Um dia, na estrada que vai de Flor da Rosa ao Convento da Ordem de Cristo de Tomar, a gente parou na vila de Constância, perto do Convento de Irmãs Clarissas de Montalvo, e comprou um queijinho – que chamavam de do céu – embrulhado num papel recortado amarrado com uma fita.
Curiosa e gulosa, puxei a fita, abri o papel (o pacote já era uma delicadeza linda) e, só de ver, já dava pra entender que o doce era bem diferente do queijinho de Santarém, que mas era uma bolinha de doce d’ovos bem firme rolada no açúcar.
De olhar, já dava pra perceber que o das Clarissas era firme como um queijo e, de fato, era um mini queijo, fofíssimo, claro como um queijo pouco curado e com textura perfeita pelo açúcar da cobertura.
Numa mordida: um tanto da camada generosa, mas de espessura perfeita (que não deixava o doce enjoativo), de massa de amêndoa saborosa, firme e com aquele aroma delicioso e com o açúcar de fora, que dava mais textura, e um muito amarelo e cremosíssimo dos ovos moles que escorriam na medida certa e eram tudo de bom. Docinho pra se comer com umas 3 mordidas.
Comprei 3, o Carlos comeu 1, eu comi 1 na hora e guardei o outro pra mais tarde, precisa comer de novo e entender tudo.
Voltando pra cá, procurei por queijinhos doces nos meus livros portugueses sobre doçaria conventual (como amo o assunto, tenho alguns) e achei várias receitas de conventos diferentes, mas nenhuma como o das Clarissas.
As mais simples: só uma bolinha de doce d’ovos de gemas e açúcar, ou do mesmo doce com amêndoa, já bem consistente (quase que no ponto de brigadeiro), enrolada meio irregular ou achatada.
Achei umas duas versões em bolinhas achatadas com doce d’ovos com bastante amêndoa e bem firme recheado com ovos moles e também passadas no açúcar comum ou de confeiteiro e mais duas com recheio de doce de gila (um tipo de abóbora que entra em muitos doces portugueses) ou de doce de castanha portuguesa.
Outra versão, já mais elaborada e com visual mais de queijo: a mesma base do doce com amêndoa como recheio de um mini sanduíche redondo feito com 2 hóstias, depois levado ao forno por uns minutos pra dar uma dourada e ainda rolado no açúcar.
E também achei algumas versões familiares pra servir em fatias e chamadas de queijo do céu.
Coloquei “queijinho do céu” na minha lista gigante de receitas pra fazer um dia, escrevi ao lado os resultados das primeiras pesquisas, mas não fiz.
Até que agora em fevereiro, depois da semana com a Comitiva do Rabo ao Focinho pelo norte de Portugal, passei quase uma semana em Lisboa e, claro, comi doces aos montes.
Fui a nem sei quantas confeitarias, comi alguns que já conhecia e queria comer de novo, experimentei vários outros, gostei de muitos e fiz uma listinha dos preferidos.
Se tivesse que escolher uma confeitaria e um docinho em Lisboa? Confeitaria seria a Casa dos Ovos Moles, que fica ao lado das ruínas do Convento do Carmo com o queijinho do céu.
Quando mordi o queijinho, pensei na hora no doce das Clarissa e fiquei feliz demais. Voltei lá mais duas vezes pra comer de novo e entender melhor a receita. Anotei tudo e resolvi que a vez dele tinha chegado.
Agora na Páscoa aqui na fazenda, com ovos do dia das minhas galinhas, resolvi fazer ovos moles, que eu amo pra comer de colher com uma polvilhada farta de canela.
Fiz uma receita de ovos moles com 6 ovos, separei metade pra comer com a minha mãe, que também ama, e metade pra fazer o queijinho. O queijinho ficou exatamente como eu queria: como um mini queijo de olhar (coloquei todos eles numa tábua e dava até pra imaginar uma miniatura de queijaria), com o gosto e a textura do docinho das Clarissas e da Casa dos Ovos Moles.
Já aviso: a receita dá um pouco de trabalho e pede paciência, mas o docinho é muito especial, vale a pena.
E quanto aos nomes: achei queijinho d’ovos, queijinho com amêndoas queijinho de bolota (o da castanha portuguesa), queijinho de abóbora ou queijinho de gila, queijinho real, queijinho conventual e queijinho do céu, que é o de hoje. E, segundo dizem, seria queijinho do céu porque, de tão bom, ele te leva ao céu. Amo esses nomes!
O RECHEIO DE OVOS MOLES
Pra rechear o queijinho, a gente precisa de uma receita pronta de ovos moles portugueses e que precisam estar firmes na hora de usar.
Como aqui Na Cozinha da Helô já tem o post dos ovos moles com várias dicas e a receita, resolvi aqui já falar em 1 receita de ovos moles (só clicar no link e você já cai lá).
O ideal é preparar o doce na véspera, ou com pelo menos 6 horas de antecedência, pois só depois de esfriar é que ele encorpa e fica na consistência boa pra usar como recheio. Na verdade, dá pra fazer os ovos moles com até 3 dias de antecedência e deixar na geladeira.
Vai sobrar um tanto, pois a quantidade de recheio que vai em cada docinho é pequena, mas isso não é grave, o doce é tão bom que a gente come de colher.

OS OUTROS INGREDIENTES
Além dos ovos moles do recheio, a receita do queijinho leva só farinha de amêndoa, açúcar comum e clara.
A farinha de amêndoa é o ingrediente principal, feita com amêndoa crua moída fininho, pra virar pó, e tem que ser de amêndoa crua porque, só assim, ela solta os óleos naturais e, junto com o açúcar e a clara, viram massa de amêndoa.
Comprar uma boa farinha de amêndoa fininha – e que sempre é feita com amêndoa crua – é a solução mais simples pra se fazer a receita, só abrir o pacote e usar.
Além da praticidade, a farinha vem moída na espessura certa, as caseira ficam irregulares, com grãozinhos maiores e menores.
É importante ir atrás da farinha num mercado que tenha produtos bem frescos e de qualidade, pois pra que ela tenha sabor e aromas agradáveis e solte óleo na medida certa pra dar consistência à massa, sem deixar oleosa ou seca. Ou seja, atenção com o fornecedor e com a data da validade.
Mas a falta da farinha pronta não pode ser motivo pra gente não fazer e não comer um doce tão bom. Dá pra fazer a farinha em casa tendo amêndoas cruas e um processador que triture bem, pois só com um motor bom a gente consegue uma farinha fina.
No liquidificador comum, a farinha fica muito irregular e cheia de grãozinhos maiores.
Fazer a farinha em casa a partir de amêndoas cruas não é difícil, só precisa de atenção. Se as amêndoas já estiverem sem pele, é só seguir no processador, mas se forem com pele a gente tem que descartar a pele e dar uma leve secada antes de usar.
Pra retirar a pele: coloco as amêndoas numa panela com água já fervente e deixo no fogo por 5 minutos, a água vai ficar meio bege.
Coloco o forno pra aquecer a 160ºC (médio-baixo) e separo uma assadeira pequena.
Escorro as amêndoas numa peneira e deixo amornar por uns 10 minutos, o bastante pra dar pra segurar com as mãos. Em seguida, com as pontas dos dedos, pressiono uma amêndoa por vez na base mais gordinha e a pela
Em seguida, pra descartar a pele, só pressionar uma amêndoa na base mais gordinha e ela se solta com facilidade.
Como as amêndoas ficam muito úmidas com o processo, é importante espalhar todas elas na assadeira e levar ao forno por uns 5 minutos pra secar um pouco (não é pra dourar ou torrar, só mesmo pra perder um pouco da umidade).
Elas têm que continuar cruas, só assim liberam o óleo que, junto com o açúcar, faz com que tudo se transforme na massa de amêndoa.
E mais uma coisa: fazer a massa de amêndoas faz parte do processo e é gostoso. Mas como sei que tem gente que vai perguntar se dá pra usar massa pronta – o marzipã – já digo que sim, mas acho que não só o preparo perde muito da graça, como o custo sobe muito, muito mesmo, além de não ser fácil de achar marzipã puro só de amêndoas e açúcar, sem chocolate, por aqui.
PREPARO
Com a farinha pronta e o recheio de ovos moles já preparado e frio, chega a hora de preparar a massa de amêndoa e modelar os queijinhos.
O processo não é difícil, mas tem uns truquezinhos, e com a prática tudo vai ficando mais fácil e rápido.
A massa de amêndoa não vai ao fogo, é só de misturar e a clara se conserva pelo açúcar e pelo óleo da amêndoa.
Numa tigela grande, coloco a farinha de amêndoa com o açúcar e a clara e misturo até conseguir uma farofa. Em seguida, na própria tigela ou na bancada, começo a trabalhar com as mãos, esfregando bem pra conseguir que a amêndoa solte o óleo natural, o açúcar se dissolva com a umidade e tudo se transforme numa massa macia e lisa. Nesse ponto, a gente para, pois excesso de trabalho faz com que a massa fique oleosa.
Sobre ficar lisa: se a farinha de amêndoa for fina, a massa ficará mais delicada, lisa e com chances menores de rachar e as farinhas mais grossas ou não tão uniformes (as caseiras são assim), acabam dando umas rachadas, mas nada que comprometa a delícia do doce.
Com a massa pronta, vem a modelagem, que não é difícil, mas dá um trabalhinho porque a gente tem que modelar os doces um a um. O que importa é assumir que nada de grave se ficarem com tamanhos irregulares, são caseiros e gostosos sempre.
Primeiro, polvilho a bancada com uma camada farta de açúcar pra massa não colar, bem importante. Depois, divido a massa em 12 partes e começo a modelar.
Pego 1 parte de massa e divido em 2 pedaços, um maior (3/4 da massa) e 1 menor (¼ da massa). Esse pequeno eu vou usar pra tampar o doce no final.
Pego a parte maior e faço uma bolinha, apoio numa das mãos, pressiono o centro com um polegar pra formar uma cuia e sigo apertando no fundo e nas laterais até conseguir um copinho com uns 3 cm de diâmetro e uns 3 cm de profundidade e de espessura uniforme.
Apoio esse copinho na bancada e movimento com as mãos pra acertar e deixar a base plana (a ideia é conseguir um cilindro pra ter jeito de queijo no final).
Coloco 1 colher (chá) de ovos moles na cavidade, sempre tomando cuidado pra não melar a borda (quando mela, fica mais difícil de colar no final), depois dobro a parte de cima em direção ao centro pra começar a fechar. Pra tampar e fechar a abertura, abro aquele pedaço pequeno de massa reservado, coloco no topo e pressiono de leve pra colar.
Em seguida, acerto o formato do queijinho com as mãos e rolo no açúcar pra fazer uma camada generosa. O açúcar, além de dar textura ao doce e ajuda a manter o formato do doce, também é importante pra conservação.
Tem gente que usa um cortador redondo de uns 3cm de diâmetro, aquele aro, como molde pra conseguir um formato mais perfeito e funciona. Pra fazer assim: polvilhe bem o aro e a bancada com açúcar pra massa não colar e o doce desmontar na hora de soltar; coloque o pedaço de massa no fundo, siga pressionando com os dedos pra forrar o fundo e as laterais fazendo uma camada uniforme; recheie a cavidade, feche e depois solte com cuidado.
Os queijinhos ficam bem num pote fechado e fora da geladeira por uns 3 dias, depois começam a umedecer e podem melar.
Sobre o tempo pra preparar os queijinhos: calculei mais ou menos 1h30M contando com os ovos moles prontos e gelados e com calma e tranquilidade pra fazer a massa de amêndoa e modelar os docinhos, tarefa que pede paciência, mas que cabe nesse tempo.
Outros doces portugueses deliciosos aqui Na Cozinha da Helô: pasteis de nata, pudim de claras muito leve e delicioso, papos de anjo de antigamente, salame de chocolate e ovos queimados em calda de antigamente.
Outros doces portugueses deliciosos aqui Na Cozinha da Helô: pasteis de nata, pudim de claras muito leve e delicioso, papos de anjo de antigamente, salame de chocolate e ovos queimados em calda de antigamente. Se quiser usar um cortador redondo de uns 3cm bem como molde pra conseguir um formato mais perfeito: polvilhe bem o aro e a bancada com açúcar pra massa não colar e o doce desmontar na hora de soltar; coloque a bolinha de massa no fundo, siga pressionando com os dedos pra forrar o fundo e as laterais fazendo uma camada uniforme; recheie a cavidade, feche e depois solte o doce com cuidado.INGREDIENTES
Preparo
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