ROMÃ COM RECEITAS E HISTÓRIAS
Era uma vez uma romãzeira que cresceu e cresceu, deu frutos aos montes e abasteceu a minha cozinha com muitas sementes suculentas por alguns anos.
Até que, num dia de verão, depois de ter deixado que seus frutos tentadores fossem colhido e lindamente fotografados, quase como numa despedida, ficou tão aterrorizada com os raios e trovões de uma tempestade apavorante que caiu e morreu.
Foi exatamente isso que aconteceu na minha casa. A romãzeira nasceu no jardim ao lado da sala de jantar e ficou tão grande que passei a colher os frutos lá do alto apenas esticando o braço pela janela do meu quarto.
Todo ano, eu colhia elas bem vermelhas e maduras, algumas até começando a rachar, soltava as sementes rosadas e brilhantes como pedras preciosas e usava para fazer sucos, incrementar saladas e preparar xarope. Eram muitas romã e sempre doces demais.
Na véspera da tempestade de dezembro, logo cedo eu e a Elita pegamos a escada, colhemos umas 12 romãs imensas e colocamos numa gamela. Logo depois, o meu super querido fotógrafo Romulo Fialdini tocou a campainha pra gente fazer umas fotos pra uma revista. Assim que ele entrou na cozinha, antes de começar o trabalho, ele fotografou as romãs.
A tempestade da noite foi daquelas de filme, com raios, trovões e tanto vento que a romãzeira amanheceu no chão, com as raízes pra fora e terra pra tudo quanto é lado. Liguei chorando pro Romulo, que me mandou a foto pra que eu nunca me esquecesse das romãs.
Com as frutas colhidas, fiz um xarope maravilhoso, que usei gota a gota pra não acabar logo e, uns dias depois, fiz uma receita de pasta de frutas secas e romã, que eu adoro.
AS ROMÃS
Pensando bem, tive romãzeiras nas três casas em que morei depois de casar e tenho 3 delas bem ao lado da casa da fazenda.. Sempre ouvi dizer que elas davam sorte, mas as plantei porque gosto das flores alaranjadas e das frutas lindas e saborosas.
Na verdade, eu me apaixonei pra valer pelas tais pedrinhas preciosas numa viagem ao Egito, principalmente quando visitei Alexandria e comi romãs ultradoces pela rua.
Nessa viagem, em 1996, eu comprei um livro antigo sobre a cozinha turca de bouquiniste em Paris, li de ponta a ponta e aprendi alguns truques valiosos sobre as romãs.
A senhora do livro dizia que, pra abrir uma romã, nada como rolar a fruta inteira sobre uma superfície lisa e apertando bem, depois abrir pressionando com as mãos ou com a ajuda de uma faca e separar as sementes das partes esbranquiçadas, que fazem amargar qualquer preparação.
Até aquele dia, eu costumava cortar a fruta ao meio, como se fosse uma laranja, bater com uma colher de pau na casca pra soltar as sementes, depois virar a casca pra soltar o que não estivesse saindo com facilidade.
E ela confirmava que, pra extrair o suco, nada como o método tradicional: colocar as sementes no centro de um pano limpo, juntar as pontas pra fazer uma trouxa e espremer com força até o suco de cor estonteante terminar. O pano fica rosado, não tem jeito, e se transforma no pano de espremer romãs.
RECEITAS
Os refrescos que tomei no Egito eram deliciosos e a salada fatoush da minha querida Leila Youssef do Arábia, comprovaram por A + B que as sementes de romã dão, não apenas beleza, mas também textura e sabor ao prato.
E foi depois de ler aquele livro turco que eu passei a usar as romãs também pra fazer xarope e ter gosto e sabor dessa fruta linda e gostosa por muito tempo depois da colheita..
Pra beber o suco, basta levar pra gelar, nem adoçar precisa, de tão doce que é.
Pro xarope, coloco bastante líquido da fruta numa panelinha e deixo reduzir até encorpar e cobrir o dorso de uma colher, como se fosse groselha. Então, pra conservar, junto um pouco de açúcar e de suco de limão, deixo ferver por uns minutos e guardo na geladeira. Também já usei cascas de romã pra tingir tecidos de algodão, que ficam amarelíssimos.
Pelo que se sabe, a romãzeira, Punica granatum, é natural da região da Ásia Menor e Irã e é há muito considerada uma árvore sagrada, ligada ao amor e à fecundidade, tanto que os egípcios a usavam em seus cultos, os gregos associavam a fruta à deusa Afrodite e os romanos continuaram na mesma linha.
Na Bíblia, a romã também aparece, e os judeus a usam em rituais de passagem de ano, pois acreditam que ela ajuda a fazer o ano que chega ser melhor do que o que está terminando. E muita gente ainda jura que três sementinhas na carteira não deixam faltar dinheiro.
Se eu já tinha bons motivos pra gostar das romãs, ganhei mais um quando li “Sombras da Romãzeira”, do Tariq Ali, um romance sensacional que se passa em Granada. Vale a pena ler!
A fruta tem várias propriedades medicinais, ajuda a controlar o colesterol e a pressão arterial, alivia sintomas da artrite, combate a diarreia e ainda auxilia no trabalho de parto.
Quais as melhores romãs do mundo? Pergunta difícil. Além das brasileiras, que são muito boas, eu já comi espanholas, francesas provençais e egípcias excelentes, mas sei que há italianas, gregas, turcas, sírias, libanesas, além das iranianas, iraquianas e afegãs (estas consideradas as melhores por muita gente). Enfim, boas romãs não faltam!
A foto das romãs de hoje são da Ana, minha filha e fotógrafa querida demais. A do Rômulo simplesmente desapareceu … sumiu numa troca de computador, já virei e revirei tudo …
Mais duas receitas com romã que tenho aqui Na Cozinha da Helô: pasta de berinjela e romã e salada de grãos com romã e amêndoa.